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Às vésperas da eleição, os jornalões saem do armário

Por Moisés Mendes, no 247:

Se a Globo não fosse inimiga juramentada de Bolsonaro (por iniciativa de Bolsonaro, e não o contrário), Merval Pereira poderia levar o bolsonarismo para dentro da Academia Brasileira de Letras

Claro que não o bolsonarismo raiz, esse desbragado, que defende torturadores e a morte de gays e índios. Mas levaria o bolsonarismo dito econômico e alguns dos seus derivados políticos. Levaria para o chá da tarde o bolsonarismo mais recatado, dos machos brancos e ricos, que os liberais à brasileira aceitam como forma de enfrentar Lula. Esse bolsonarismo que a elite fuma sem tragar releva o homem porque tem Paulo Guedes avalizando a PEC kamikaze e até pouco tempo tinha o boto Pedro Guimarães na Caixa. Essa extrema direita não é problema para a direita sem pai, sem mãe, sem tucanos e sem terceira via. Se Bolsonaro não fosse inimigo declarado da Folha (também por decisão de Bolsonaro, e não da Folha), a organização dos Frias e muitos dos seus jornalistas seriam bolsonaristas assumidos. O mesmo aconteceria com O Estadão, que Bolsonaro também declarou como inimigo. Se Bolsonaro não tivesse tomado a iniciativa de afrontar Globo, Folha e Estadão, haveria sempre a possibilidade de aproximação e convergência de interesses. No início foi assim. Bolsonaro arrancou bem e ganhou a simpatia dos jornalões quando chamou Paulo Guedes e Sergio Moro. Os dois e os militares acalmavam Merval Pereira e outros que não citarei aqui para evitar que os não citados se queixem de discriminação. Guedes, Moro e os generais eram a garantia de que Bolsonaro seria tutelado e de que todo o resto poderia ser assimilado. E todo o resto eram os ataques às pessoas LGBTI+, aos povos das florestas, à ciência, às universidades e à vacina, ao lado dos elogios à tortura e à ditadura. O jornalões manifestariam incômodo com algumas boiadas, grileiros, garimpeiros, contrabandistas de madeira e similares, mas poderiam engolir Bolsonaro, se ele não fosse inimigo declarado de Globo, Folha e Estadão. Quando Merval Pereira anuncia agora que Lula pode se preparar para o jogo sujo que vem aí, o que se deve ler é que as Organizações Globo não jogam pela terceira via, porque sabem que isso não existe. Jogam o jogo de Bolsonaro e dos militares, nem tanto por opção, mas por exclusão, porque a escolha difícil penderá sempre para o candidato da extrema direita. A Globo (TV e jornal), a Folha e o Estadão, com outros menos votados, criaram Bolsonaro, que se voltou contra eles em defesa dos territórios dos bispos empreendedores da mídia religiosa. Há ingratidão nos ataques de Bolsonaro aos três inimigos, porque o sujeito não existiria sem Globo, Folha e Estadão. E os três não seriam nada hoje se não tivessem como pretexto de sobrevivência o embate com Bolsonaro. Bolsonaro foi criado pelas grandes corporações de mídia e essas vivem do sangue de Bolsonaro. Se não pudessem vampirizar a própria criatura, as três estariam hoje à beira da morte. É o teatro do enfretamento de Bolsonaro que mantém seus inimigos vivos e ainda dentro do armário. Mas na hora da verdade, às vésperas da eleição, a escolha precisa ser feita. O homem da Natura resumiu, com a sinceridade que os jornalões não têm, o dilema dos liberais brasileiros. Batam em Bolsonaro, mas batam muito mais em Lula e tapem o nariz. Se não tem jeito, que se repita 2018, mesmo que o cenário ideal seja outro. Muitos empresários gostariam de ver um golpe militar que fosse executado e logo descartasse Bolsonaro. Uma das diferenças entre o liberalismo brasileiro e grileiros e milicianos é que esses últimos não produzem águas cheirosas. Ainda não.

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