Por Gustavo Conde, no 247:
Por que a mentira chegou com tanta força e ganhou tanta adesão no Brasil nos últimos 5 anos?
Antes, nos anos 90 para se dar apenas um exemplo, o modo mentiroso - e demagógico - de enunciar era quase uma exclusividade dos políticos de direita, como Paulo Maluf.
No plano regional, ele continuou sendo eficiente, elegendo essa casta de oportunistas.
Mas, no plano nacional, a coisa mudou. A direita não encaixava mais um discuso sequer.
Anti-popular e burrinha, a direita ia sendo empurrada para o soterramento eleitoral, tomando lavadas do PT.
Era preciso turbinar a mentira, fazer com que as pessoas voltassem a sentir tesão em mentir e a votar em quem mentisse, em escala.
É nesse momento que o jornalismo corporativo rasga a fantasia e parte para derrubar um governo.
O país passa a ter uma engrenagem de produção de mentiras sofisticada e articulada, imprensa e judiciário puxando o pelotão.
Qual a explicação técnica (e histórica) para isso - para além da falta de caráter endêmica desses setores da sociedade?
Resposta: vencer a democracia e a soberania popular dizendo a verdade é praticamente impossível.
O PSDB tentou por 3 vezes tirar o PT fazendo o debate franco - mas envergonhado - do neoliberalismo versus o estatismo ('estatismo' na semântica deles) e perdeu todas.
Ter o PSDB como adversário da democracia e da soberania popular foi umas das melhores coisas que a esquerda jamais sonhou agradecer: era fácil - e gostoso - ganhar do PSDB.
No debate frontal, a dissimulação perde.
Eis a razão para que houvesse uma consagração deliberada pelo modo-mentira de enunciar - cujo subproduto mais emblemático é Jair - Cem Mil Mortes - Bolsonaro.
Ganhar do PT falando a verdade seria impossível.
Os anti-petistas - bolsonaros, baixos-cleros, tucanos, jornalistas de cativeiro, empresários subdesenvolvidos, ultra-esquerdistas e maus perdedores em geral - aceitaram a tarefa de mentir de maneira alucinada e constante para destronar não o PT do governo, mas 'verdade' de cena (o debate técnico e qualificado sobre o país e sobre a sociedade).
O castigo - a maldição - que se recai sobre o Brasil neste momento é o genocídio provocado por esse modo mentiroso de enunciar.
Todos estão paralisados, até o jornalismo 'profissional' - que já se arrependeu de mentir tanto mas que ainda tem vergonha de admitir isso publicamente.
Já há gente querendo que Lula e o PT consertem a imensa besteira que eles mesmos fizeram - porque sabem, conscientemente ou não, que é preciso restabelecer um processo real de debate, baseado em premissas reais e em propósitos reais (verdadeiros).
O problema é que a vergonha é um sentimento muito difícil de superar. Meninos de recados como Ascânio Seleme, do jornal O Globo, costumam ser mais um capítulo do constrangimento geral que é mentir e depois não saber como arcar com as consequências dessa mentira (meu 'recadinho' para a Globo).
Todos começam a querer reavivar as porções 'Lula' de suas identidades fraturadas (todos têm uma porção Lula, como todos têm uma porção Bolsonaro), mas o fazem sem um pingo de autocrítica - e com as calças molhadas diante da impiedade da história.
A verdade voltará. Não a verdade autoritária dos livros de filosofia eurocêntrica. Não a verdade messiânica dos religiosos fanáticos. Não a verdade folclórica dos meios de comunicação autoproclamados 'profissionais'.
A verdade que voltará é a 'verdade linguística', a verdade dos modos de produção do sentido, a verdade do processo de significação, a verdade do gesto enunciativo, da fala, do olho no olho.
Quando isso acontecer, tome-se mais 13 ou 20 anos de PT.
Advirto os leitores céticos desta missiva: não subestimem a si mesmos. Não subestimem a história que os revestem de identidade.
O Brasil e o povo brasileiro já deram um 'jeito' em suas elites tecnocratas e escravocratas uma vez. Darão um jeito de novo - e a segunda onda costuma ser 'pior'.
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