Por Moisés Mendes. em seu blog:
Se todos os gays fossem de esquerda ou progressistas, as caminhadas de hoje no país todo contra Bolsonaro teriam o dobro ou o triplo de participantes.
Pode ter 10 vezes mais gente numa Parada Gay do que num ato político contra o fascismo. É a realidade. Assim como os participantes da Marcha da Maconha não são necessariamente progressistas.
Há muito tempo as questões identitárias não têm conexão direta nenhuma com as lutas das esquerdas ou com movimentos sociais clássicos.
Uns acham que isso é um problema, porque o identitarismo mascara a luta de classes e as questões mais amplas e compartimenta a resistência e as demandas, e outros acham que assim é o mundo no século 21.
Há gays bolsonaristas, como há maconheiros reaças e negros racistas. Nem todos se envolvem com questões de identidade como se fossem uma luta política convencional.
O cara quer fumar maconha, ergue bandeiras na Marcha da Maconha e fuma maconha na rua para afrontar a polícia porque quer todas as liberdades para fumar maconha onde bem entender. E vota em Bolsonaro.
Por isso a decisão de Eduardo Leite, ao se declarar gay a um ano da campanha à eleição de 2022, deve ser vista nesse contexto.
É um governador gay de centro-direita, com políticas conservadoras em todas as áreas, e sem nada ainda que o coloque ao lado de figuras públicas que lutam pela diversidade.
E aí dizem então que ele saiu do armário para conquistar o público gay. É uma bobagem. Qualquer aprendiz de cientista político sabe que não é bem assim. Não é porque se diz gay que ele terá votos de gays.
O que Leite fez foi um movimento em que não tem nada a perder. Primeiro, porque precisa assumir sua orientação antes de uma campanha nacional.
O tema iria aparecer mais adiante, não numa pergunta feita pela boca do Bial, mas numa armadilha e pela bocarra de um homofóbico.
Segundo, porque desde que lançou a pré-candidatura à presidência em 2022, o tucano não decolou e não ganhou visibilidade.
O almoço de apoio no Piratini, com deputados do PSDB de todos os Estados, que anunciou a pré-candidatura, aconteceu em 25 de fevereiro.
Passaram-se quatro meses e meio e Leite não aconteceu, apesar de ganhar espaço a todo momento na programação da Globo.
A declaração feita na entrevista a Pedro Bial teve impacto. A notícia de que é gay deve ter sido a mais comentada da sexta-feira na internet.
O governador ganhou exposição, fez um gesto aprovado por nomes e lideranças das esquerdas e apresentou-se a quem não o conhecia.
O Brasil está sabendo que o governador gaúcho, da terra da extrema direita negacionista e cloroquinista que bajula Bolsonaro, é gay.
Sem Moro e sem Huck, aí pode estar a terceira via que a Globo procura desesperadamente. É isso e nada mais do que isso. Leite é o que é.
Não dá para cobrar que ele seja um gestor mais à esquerda, que desista da privatização da água e do Banrisul, que pare de estimular o uso de venenos agrícolas e que não facilite a vida de mineradoras que destruirão o ambiente do entorno do Guaíba.
Dá apenas para exigir que se desculpe pelo apoio a Bolsonaro em 2018. Sim, exigir. Nada de pedir por favor.
Um governador que se declara gay terá em algum momento que dizer: errei em 2018 e peço desculpas.
Se não se desculpar, é porque continua com receio de perder apoio dos gaúchos reacionários.
Os mesmos que, em 2002, correram a galope do desfile Farroupilha, em Porto Alegre, o Capitão Gay (foto), um personagem que tentou e conseguiu provocar e ira dos machos dos CTGs.
O Capitão Gay, que se chama José Antônio San Juan Cattaneo, também é de Pelotas, a terra de Leite. O que aconteceria hoje se ele decidisse voltar pilchado à perimetral no 20 de Setembro?
Seria um bom teste para um Estado que talvez tolere um governador gay, mas não aceite um gaudério gay desfilando a cavalo, com a bandeira do arco-íris, entre bombachudos inseguros.
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