Por Emir Sader, no 247:
A pesquisa do Datafolha confirma não somente o favoritismo de Lula como a debacle de Bolsonaro. Um candidato erigido a favorito da direita foi alçado ao governo do Brasil por meio de uma gigantesca manipulação feita pela mídia, pelo Judiciário e pelo grande empresariado e foi da glória à debacle em pouco tempo. Agora enfrenta o tão temido – por ele e por seus filhos – caminho da derrota.
Um candidato que conquistou o coração e as mentes da mídia e do empresariado, encarnou, antes de tudo, a única via que sobrava para a direita, para tentar impedir o retorno do PT ao governo. Resgataram Bolsonaro do fundão do Baixo Clero para salvar a direita.
Os eleitores de Bolsonaro em 2018 foram, essencialmente, os que assumiram o antipetismo como a maior bandeira do Brasil. O país estaria à beira do abismo, havia que resgatá-lo, daí o papel do salvador da pátria do candidato das milícias, que passou a ser o candidato da direita brasileira.
Chegou ungido da imagem daquele que conseguiu derrotar o PT, com bases de apoio de segmentos evangélicos, da burguesia, da mídia, do Judiciário e de bases populares lumpen. Propôs-se a renovar a política, com discurso anti-mídia, anti-Judiciário, anti-Congresso e, sobretudo, anti-esquerdista. Com política econômica ultra-neoliberal, conquistou o empresariado e a mídia econômica.
Teve vigência enquanto não teve que pagar o preço das vítimas da pandemia e da sua política econômica.
A volta de Lula à vida política é um golpe fatal para ele, ao demonstrar de novo que a alternativa para o Brasil está à esquerda e não à direita. Ao apontar que Bolsonaro é o representante dos ricos, o responsável pela miséria e pelas vítimas da pandemia. Que o Brasil tem jeito, contanto que derrote o Bolsonaro. E que ele, Lula, é o caminho para o resgate do país.
A debacle e a derrota de Bolsonaro será uma nova grande derrota da direita, depois do fim da ditadura e da incapacidade de eleger de novo um presidente, derrotada pelo PT em quatro eleições sucessivas. Desta vez o Bolsonaro ameaça levar com ele, na derrota, muita gente.
Será, antes de tudo, mais um fracasso do modelo econômico neoliberal, tirado das catacumbas por Paulo Guedes e que, de novo, demonstra que não está feito nem para a economia andar, nem para criar empregos. O empresariado e a mídia econômica, arautos do neoliberalismo, serão derrotados de novo. O país terá nova oportunidade de construir uma política econômica alternativa, superadora do neoliberalismo.
Será uma nova derrota dos militares e da militarização da política. Não tiveram até agora uma derrota no Brasil na escala do que aconteceu na Argentina, no Uruguai e no Chile. Na Argentina, pela derrota na guerra das Malvinas. No Chile, pela derrota do Pinochet no referendo em que pretendia ser candidato de novo. No Uruguai, pelas derrotas nos dois referendos sobre privatização de empresas públicas. Desta vez, diante da circunstância de que, uma vez mais, democratizar significa desmilitarizar o Estado brasileiro, terão que explicar sua aventura no governo Bolsonaro e sua derrota.
Será também uma derrota da mídia econômica e do consenso neoliberal que conseguiram impor como “consenso nacional”. Uma derrota da criminalização do Estado, das “virtudes” do mercado e do empresariado privado, da centralidade do ajuste fiscal, do equilíbrio das contas públicas e da luta contra a inflação, da diabolização dos gastos públicos, especialmente dos recursos para políticas públicas, da manutenção das desigualdades sociais.
Tentarão se esconder no mau desempenho do Paulo Guedes para tentar esconder o novo fracasso do neoliberalismo.
Será derrotado também o empresariado especulativo, anti-nacional, que vive das privatizações, neoliberal por conveniência. Ficará claro que esse grupo não está interessado na retomada da economia produtiva, que gera empregos.
Ficarão derrotados também – já o estão sendo, conforme as pesquisas demonstram o apoio que grande parte deles já dá a Lula – os evangélicos fanáticos, aderidos ao bolsonarismo, portadores do discurso do ódio.
Será derrotado o discurso do ódio, que faz do outro o diabo, o inferno, o inimigo, que torna a luta política uma batalha contra adversários inventados pelo ódio.
Em suma, com Bolsonaro serão derrotados os inimigos do Brasil, da paz, da harmonia, da resolução dos problemas pelo debate, os inimigos da inclusão social e da luta contra as desigualdades.
Bolsonaro levará consigo, na derrota, todo o bando que o elegeu, que o sustentou, que fez dele o “salvador do país”.
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