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Alagoas Território Livre

A cara da nossa elite militar

Guerras consagram ou destroem militares. Mas o que tem mesmo destruído generais é um governo desastroso, ou a combinação das duas coisas.


Por Moisés Mendes, em seu blog:

Nenhum outro general se esforça tanto para mostrar que sua voz é a mais poderosa de todas as vozes das Forças Armadas dentro do governo.


Nenhum defende tanto Bolsonaro quanto o homem que cuida da sua segurança. Nenhum fez ameaças tão pesadas, e dirigidas ao Supremo, sobre os riscos da ‘instabilidade’.


O ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, é um general único, em todos os tempos.


Nenhum outro general caminhou num domingo na Esplanada dos Ministérios e se misturou aos amigos de Sara Winter nos atos fascistas que pediam o golpe. Outros andaram por perto, mas não desceram do helicóptero.


Nenhum fala, como ele falou ontem, em nome do que possam ser os interesses nacionais diante do que considera a ameaça dos estrangeiros que cobiçam a Amazônia.


Heleno disse que nações, entidades e personalidades estrangeiras mentem sobre a Amazônia, porque têm interesses na floresta e conspiram contra o Brasil e contra Bolsonaro.


Heleno fala de qualquer assunto e mais alto do que os outros generais. Mais do que Braga Netto, da Casa Civil; Fernando Azevedo e Silva, da Defesa; Eduardo Pazuello, da Saúde; e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo.


Heleno é subordinado a um tenente, reformado como capitão, e convive no governo com um general que é o vice-presidente e com mais cinco ministros militares, todos oficiais, mas não generais.


E a cada declaração de Augusto Heleno e de qualquer um deles, o Brasil se pergunta: esses generais são de fato a elite militar do Brasil?


O Brasil conhece bem sua precária e medíocre elite empresarial. Sabe os nomes à direita e à esquerda da sua elite política.


Sabe quem é a elite intelectual. Com discordâncias, pode fazer listas das suas elites esportiva, artística e cultural.


Mas quem são as nossas elites fardadas? Seriam mesmo esses ministros de Bolsonaro, incluindo os seis generais que ele já mandou embora?


Mourão, Heleno, Braga Netto, Pazuello, Azevedo e Silva e os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica são a cara da elite militar brasileira? Há outros generais dessa elite, mas fora do governo? Quem seriam eles?


Guerras consagram ou destroem militares. Mas o que tem mesmo destruído generais é um governo desastroso, ou a combinação das duas coisas.


Colin Luther Powell era a cara da elite militar americana, até produzir uma imitação de power point colegial e mentiroso, em 2001, com fotos e esquemas das armas químicas que Saddam Hussein não tinha.


Bush invadiu o Iraque, com a ajuda do power point de Powell, e nunca mais ninguém falou do general destruído por um sujeito que precisava inventar uma guerra.


Muito antes dele, Leopoldo Galtieiri foi o último general latino-americano a inventar a sua grande guerra, também pela ilusão de que obteria apoio político.


Como ditador, Leopoldo Fortunato Galtieri Castelli inventou a Guerra das Malvinas contra os britânicos, em 1982, e empurrou para a morte 649 argentinos, a maioria jovens, muitos deles adolescentes.


Galtieri enterrou a ditadura e qualquer chance de golpe na Argentina ao ser condenado, em 1986, a 12 anos de prisão por incompetência como comandante militar.


O ditador sofreu o maior vexame de um general: não perdeu uma guerra porque o inimigo era superior, mas porque ele mesmo era um farsante como militar e como guerreiro. Era incompetente. Não sabia nada de guerras. Foi o que a Justiça Militar decretou.


Soube-se depois que Galtieri era um inseguro que berrava ordens aos subordinados e passava o dia anestesiado pelo uísque.


Era um criminoso que subiu na vida até virar general e chefiar torturadores. Com Galtieiri e a sua junta militar, os argentinos perderam o respeito pelos generais depois da tragédia das Malvinas.


A Argentina não tem mais dúvidas de que o país não conta com uma elite militar.


Não há uma elite bélica, que saiba guerrear, e muito menos uma elite pensante, um grupo de exceção que possa, por algo inexplicável, saber mais do que os civis e assumir à força o poder político do país.


Os argentinos sabem, pelos sofrimentos de uma guerra perdida e os horrores de uma ditadura, que os militares não são uma elite.


Pois olhe para Augusto Heleno, ouça o que ele diz, acompanhe o que ele faz, num momento em que Bolsonaro ameaça fazer a sua guerra contra a Venezuela.


Pense se Heleno é mesmo a cara da nossa elite militar. É bem provável que seja.

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